Apologia às Virgens Mães
Autoria: Assussena Assussena

“Quantos tempos teceram teus vestidos de lã?
Quantas tranças os tempos fizeram traçar teus cabelos?
Quantos beiços beberam do teu peito o afã?
E dos seios sugaram o sulco sem dor, dos teus zelos
Senhora de saia, de ventre predestino,
Quantos tempos cruzaram num ponto de cruz teu destino?
Oh mães de Jesus, oh virgens, todas virgens
Já choraram teu choro, prantos correm na História
Feito rio que erode do espaço às margens: trajetória
E de um traje contido, de branco e grinalda na média,
Abusaram o desejo do corpo e teu sonho trajou de tragédia
Menina de saia de gozo pré-extinto
Quantos tempos bordaram o calado bordel de teu instinto?
Oh mães de Jesus, oh virgens, todas virgens
Na sacola da feira, tem de besteira feijão
Tem também muitas eras de carga alçada em tua mão
Pudera ter tempo, senhora, tanto tempo pudera e tem
Do fruto da feira, vambora, tempos colheitas de tempo têm
Deles, tantos puseram, oh dona, de peso no saco da feira
Se de Madalena o filho, Madona 
Pesa mais: não tem eira nem beira
Não tem eira nem beira, nem eira nem beira.”

1- Apologia Às Virgens Mães - As Bahias E A Cozinha Mineira

Josefa Maria
Autoria: Raquel Virgínia

Vestiu-se de Josefa Maria na terceira década do século XX
De pele tão branquinha, sois nêga, 
São Paulo era Belém, veio seguindo Jesus.
Nordestina, filha da Paraíba, 
fez seus filhos nos trilhos da seca paulistana 
Viu o pé de jaca que plantou no seu quintal crescer, 
Sentiu as dores do mundo em seus joelhos de tanto rezar
E ir à feira, comprar bananas, lavar a roupa, arrumar as camas

JOSEFA MARIA

LATA D'ÁGUA NA CABEÇA

Esperança no Cafundó
Autoria: AssussenaAssussena

Vem meu preto pra cá, pros cafundó do meu sertão
cá vem, cá vem cá fungar, cá na caatinga do meu coração
Donde os açude de água carece
as açucena num dá mais viso
donde as ermida num reza prece
mas inda espera o desaguar do teu sorriso
o aboio cá não se canta mais
de tristeza o canto cá logo se faz
se ruma meu preto desse seridó
e vem correndo cá, pros meu cafundó.
Vem meu preto pra cá, pros cafundó do meu sertão
cá vem, cá vem cá fungar, cá na caatinga do meu coração
A face rachada é espelho da terra
que vermelha enterra
o amarelo do sol
que vai a riscar sua escrita tão dura
que feito rapadura traduz o arrebol
E na dura beleza o doce se esconde
e pergunto aonde está meu amô
e de cá anuncia o zé cancioneiro
que nos pau do umbuzeiro o verde se trancô
Até que o aguaceiro se lance na terra
apagando a escritura marcada na pele e no chão
e da luta arrancar, da doçura a verdança
prá cá trazer as bonança pros cafundó do meu sertão
Prá cá trazer o meu preto pros cafundó do meu sertão
e cafundó de ca cum cá cum cafuné
e quero um có de quer cum quer cum quer cum quer.


ESPERANÇA NO CAFUNDÓ

Lavadeira Água
Autoria: Raquel Virgínia

Olhar pela fechadura a abertura do céu
Temer caboclo de beira, mangabeira, Gabriel
Cosmopolitano raro, cascalho no espelho do rio
Batuca lavadeira água entre tantos que pariu

Olhos nos olhos de Santa Luzia
Gruta bruta coração Vige Maria

LAVADEIRA ÁGUA

Oh Lua!
Autoria: Raquel Virgínia

Oh lua, se apareces toda nua
os meus olhos idecentes vão cantar murmurio e dor
Não sabes de mim porém, tua presença em meu peito
É nascer de vida a vida como a morte para o amor
Por querer­te perto aprendi a distância
Dos teus sopros esbanjar meus cabelos
Sou mirrado, flor e germino pétalas no asfalto
Coração vagabundo da altura da lua: a morte

Ó LUA

Comida Forte
Autoria: Raquel Virgínia

Infinito aberto ao infinito
Se esconde em ponto onde pode estar Deus
O único ponto do sol grita com seus raios
e lá no serrado o genipapo pega fogo
A estrela sol brilha e faz vida aqui na terra oiá iá
Candango come comida forte
pra contruir a capital Brasília
Candango come comida forte
pra construir a capital

COMIDA FORTE

Jaqueta Amarela
Autoria: Assussena Assussena

"Quem nos media dia a dia
O nosso sexo, amor.
O anexo,
O nexo, 
O X da nossa dor.
O amor eu aposto no jogo entre cartas
Cerveja, fogo e queijo coalho.
No baralho jogos os Ais
Te embaralho
Sou dama de paus
Caralho!"

JAQUETA AMARELA

Mãe Menininha
Autoria: Raquel Virgínia

Essa beleza do carma vivo e morto!
Essa beleza do carnaval!
Cabra­solto, gesto, carne, viva festa
Na passarela, a cobra­cega serpentina
Seu nome invade o poema nesses dias
ousadia língua quieta sem cantar
cantarolar idas e vindas nesses tempos
no compasso da Bahia meninha
Chove na Lapa esse peito a seu aberto
batucadas onde tudo faz a gente querer bem
Ah beco me leva pro pouso do sem medo belo voar
o pandeiro nesso instante eterno carinho de música
terra doce cativante de Mãe Menininha do Gantois
Não tá longe não se esconde tá na roda de samba
Tá no Ilê Yá!

MÃE MENININHA

Fumaça
Autoria: Assussena Assussena

No colo da saudade eu conduzi o braço do teu rio
a selar­me na boca o traço do vazio
do seco do seco do seco na boca
baseado da fumaça
que ameaça o vácuo da tua forma
oca oca oca oca
amor amor amor
amor amor amor
que vazio, que vazio
saciou­me o ventre com um regalo teu
arregalou­me os olhos
arrebatou­me Deus!
Na fumaça da fumaça tem a massa tem a massa
consumida pela brisa da fogueira
que à beira de um beijo seu se queimou

FUMAÇA

RETICÊNCIAS

Melancolia
Autoria: Assussena Assussena

Eu lia...
e enquanto eu ia
Lia melava meu corpo de solidão
levava minhas veias e vias de nome alegrias,
egresso meu grito, um sepultado grão
e Lia linhava as agruras,
num corpo rasura
usura em seus tons ,
e mais as tristonhas tinturas
mais tarja censura,
enlutando meus dons.
e nem as dondocas de Augusta,
donzelas ou putas
cassinos de Vegas
coloria um rosto melado
por Durer colado
de cores de Degas.
E Lia beijava e benzia de bile o semblante
o beiço bulia no breu sibilante
pro meu assovio não dar mais um pio, um pio, um pio
ela a mim me mela feito cola
colando a tristeza em meu couro
e o tempo a foice de aço amola,
apressando meu melaço sangradouro
douro, mela e doura
a doce cor de minha pele moura
louro, o sol, louro insulta minha melanina
louro sultão, que então minha dor ilumina
mina mina mina mina de solidão

MELANCOLIA

Membros: Assucena Assucena (Voz) Raquel Virgínia (Voz) Rafael Acerbi (Guitarra e Violão) Rob Aschtoffen (Baixo) Carlos Eduardo Samuel (Piano/teclado) Vitor Coimbra (Bateria) Danilo Moura (Percussão)

AsBahiaseaCozinhaMineira

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