Herança da luxúria 

O anátema profético das Parcas
Recaiu em ímpetos no nascituro
Ainda em formação nas entranhas materna. 
O filho póstumo foi gerado aos berros,
Na cama imunda do pecado.
Ungido pela insondável dor arcana.

Andarilho, nas ermas grutas, se esgueira em prantos;
Aos sete céus, estende a mão trêmula e ferida, 
Clamando a revelação do seu destino.
Incréu, apostando contra a Grande Obra,
Desbrava os mistérios délficos, 
(Agora apenas sombras de rituais obsoletos).

Acolhido no transe catártico 
Da devassidão mais profana,
A cria messiânica rejeitou seu nome;
Na terra esquálida, onde jazem os deuses ancestrais ao luar,
Sem os sonhos da magia, ecoa um único legado:
O gozo mofado na carne.

Herança da Luxúria

Cinzas do porvir

Carrego as cinzas, do íntimo porvir;
Um esboço fútil do que não serei.
Em meus dedos murchos
Escorre pus do sofrimento em chagas.

O inefável destino ressoa,
Como um eco vazio em meu ser.
Definhando na marcha lenta dos segundos,
Sinto que o último dia próximo está.
E corro, corro para o útero escuro da terra.

Nenhum destino infame a seguir.
Nenhum norte à frente...
Apenas as mágoas indigestas, 
Que ainda emanam das ruas esquálidas
Onde um dia abandonei
A carne rígida.

(Marcell Diniz)

Cinzas do Porvir

Música composta por: Marcell Diniz
Guitarras: Marcell DZ
Sussurros thelêmicos e mantras: Marcell Dz
Flauta Transversal: Marcell Dz
Programações: Marcell Dz

Andarilho do Subsolo

É inverno, o torpor das ilusões se exalta,
Sutil, a pairar sublime no sonho idílico do agora.
Fantasmas abjetos advindos das reentrâncias da alma
Ignoram os brados íntimos, e vagueiam pelas finas texturas
De cada sentimento molestado pelo tempo.

Em melódicos encantos a mágoa recôndita 
Toma forma e se apodera até do mais inútil desejo.
Perpassa na carne dormente uma gélida sensação,
Nostálgica, genuína, ignota...
É apenas o sussurro já obsoleto do que fora vivido
Impetuosamente em lágrimas.

A tristeza suave, da qual o homem foi esculpido,
Acalenta-o em cânticos introspectivos.
Da sua dolência inata,
Cada resquício d’outrora, 
Emana em imagens musicais
Na polifônica orquestra do ser em dispersão.

Os dedos tocam o ar, os olhos fitam o vasto vazio;
Memórias brotam do orvalho nas folhas virgens 
E tudo permanece lúgubre, inânime,
Quando a densa chuva do inverno desponta no dia.

(Marcell Diniz)